terça-feira, 29 de abril de 2014

Análise questiona os Pagamentos por Serviços Ambientais

          A financeirização da Natureza
Aliança RECOs
Redes de Cooperação Comunitária Sem Fronteiras

“ .....Na semana passada, um estudo do Instituto O Direito por Um Planeta Verde (IDPV) concluiu que esse mecanismo é mesmo capaz de promover mudanças ou de manter atitudes em prol da preservação do meio ambiente.  No entanto, há ainda dúvidas sobre os PSAs, e muitos questionam se são realmente uma ferramenta benéfica para a sociedade.  Nesse sentido, a ONG World Rainforest Movement (WRM) publicou recentemente o relatório 'Comércio de Serviços Ecossistêmicos: Quando o pagamento por serviços ambientais dá uma licença para destruir', no qual destaca que colocar um valor monetário na natureza é um erro...”


Análise questiona os Pagamentos por Serviços Ambientais
Autor: Fabiano Ávila   -   Fonte: Instituto CarbonoBrasil

http://www.institutocarbonobrasil.org.br/arquivos_web/geral/capaservimalamb.jpg
Geralmente não damos o real valor para muitos dos benefícios que recebemos de um ecossistema sadio, como água potável, polinização e equilíbrio climático: apenas os aceitamos como se fossem dádivas que sempre estarão disponíveis para nosso uso. 

Porém, com o avanço da degradação ambiental do planeta, ficou claro que esses tipos de 'serviços ecossistêmicos' são essenciais para a nossa sobrevivência e deveriam ser protegidos. Dessa forma, começaram a surgir diversas modalidades do que hoje chamamos de 'Pagamentos por Serviços Ambientais' (PSAs), iniciativas que remuneram pessoas responsáveis por manterem os ecossistemas sadios, sejam elas agricultores, povos nativos ou proprietários de terras.

Na semana passada, um estudo do Instituto O Direito por Um Planeta Verde (IDPV) concluiu que esse mecanismo é mesmo capaz de promover mudanças ou de manter atitudes em prol da preservação do meio ambiente. 

No entanto, há ainda dúvidas sobre os PSAs, e muitos questionam se são realmente uma ferramenta benéfica para a sociedade. 

Nesse sentido, a ONG World Rainforest Movement (WRM) publicou recentemente o relatório 'Comércio de Serviços Ecossistêmicos: Quando o pagamento por serviços ambientais dá uma licença para destruir', no qual destaca que colocar um valor monetário na natureza é um erro.

"Longe de reduzir a destruição, uma natureza vista pelo capital se torna parte integrante da manutenção de um sistema econômico que depende da destruição dessa natureza para sobreviver”, explica o documento.

Segundo a WRM, o comércio de serviços ambientais não tenta modificar o atual modelo de produção e consumo, que seria a principal causa para a destruição ambiental, e por isso é um mecanismo que não tem como dar certo.

"O comércio de 'serviços ecossistêmicos' anda de mãos dadas com a 'economia verde': ambos são baseados no pressuposto de que o crescimento ilimitado é possível em um planeta finito e de que se trata apenas de organizar melhor esse crescimento para torná-lo 'verde'", explica.

"O pagamento e o comércio de 'serviços ambientais' é uma tendência promovida pelo setor financeiro, bancos multilaterais, organizações conservacionistas, governos e outras instituições sob o falso argumento de que o cálculo do valor monetário (ou o preço) das funções naturais vai contribuir de alguma forma para ajudar a conservar a natureza. Esse novo ataque do capital visa tornar visíveis aos mercados financeiros novos aspectos da natureza ainda não dominados pelo capital", completa.

Para a WRM, a resposta para a preservação da natureza passa por leis mais rígidas para punir quem destrói o meio ambiente.

"Dizer 'Não às compensações' significa dizer 'Sim' à manutenção das empresas dentro das leis definidas por limites, multas e penalidades claras (...) Os esquemas de PSA que dão permissão para destruir a natureza acima do que a lei permite aumentarão o poder corporativo ainda mais. É necessário o oposto."

A versão em português do relatório da WRM pode ser acessada aqui.

domingo, 27 de abril de 2014

NOTA DE REPÚDIO A PRISÃO IILEGAL DO CACIQUE BABAU

Nós lideranças indígenas de Mato Grosso do Sul exigimos: libertem o Cacique Babau do povo Tupinambá! Caso contrário, iremos iniciar a retomada de nossos territórios tradicionais e abandonaremos a mesa de negociação do Governo Federal!
Repudiamos a prisão ilegal do cacique Babau Tupinambá, que após um intenso processo de criminalização, ataques ao seu povo e inúmeros atentados contra a sua vida, num ato honroso, decidiu se entregar à Polícia Federal durante audiência unificada das comissões de Direitos Humanos da Câmara e do Senado, no Congresso Nacional, em Brasília (DF).
O cacique Babau representando os povos indígenas do Brasil, iria viajar para o Vaticano para encontro com o papa Francisco. Foi denunciar justamente este processo de injustiça e violência histórica que nossos povos estão submetidos. Mesma injustiça que o impediu de viajar. Repudiamos a Policia Federal que em menos de 24 horas depois de emitir o passaporte, o suspendeu baseado em mandados de prisão criminosos e ilegais: três já arquivados em 2010 e outro da Justiça Estadual de Una, pelo qual agora Babau é levado para a carceragem. Esta atitude da Policia Federal escandaliza mais uma vez as articulações política inescrupulosa do governo brasileiro, em não querer que a situação dos povos indígenas do Brasil seja denunciada internacionalmente. 
Cacique Babau é referência da luta dos povos indígenas do Brasil e nosso companheiro de luta. Não aceitaremos essa sistemática criminalização de nossas lideranças que lutam pela recuperação dos nossos territórios tradicionais.
Diante disso viemos a público afirmar: se não libertar o cacique até o dia 28 de abril de 2014, iremos iniciar as retomadas de nossos territórios e abandonaremos as mesas de negociação instalada em Mato Grosso do Sul.
Como afirmou nossa liderança: “Tiraram nós do nosso território e agora continuamos no mesmo impasse. Estão querendo nos matar. Querendo, não, estão nos matando. Quero que este parlamento ou nos mate de uma vez ou faça alguma coisa. Daqui eu vou sair pra prisão, daqui a pouco”, disse Babau ao chegar à Câmara Federal. Babau disse ainda que não irá fugir: "Não devo nada. Tupinambá não foge. Vamos até o fim".
Cacique Babau, nós estamos com você, vamos até o fim!
Conclamamos todos os povos indígenas do Brasil, organizações indígenas, nossos aliados, organizações de direitos humanos a se unir neste ato pela vida de Babau, pela recuperação de nossas terras, pela justiça de nossos povos.
Dourados, MS, 24 de abril de 2014.
Subscrevem:
Conselho Aty Guasu Guarani Kaiowá
Conselho do Povo Terena
Conselho do Povo Kinikinau
Conselho do Povo Ofaié

sábado, 26 de abril de 2014

LIBERDADE PARA BABAU




Envie uma mensagem ao ministro do STJ Sebastião Reis pedindo ‘Liberdade pra Babau!’

Fonte: Cimi DF

Cacique Babau Tupinambá está sob custódia da Polícia Federal,em Brasília. Um mandado de prisão contra a liderança, expedido em 20 de fevereiro pela Justiça de Una, Bahia, veio à tona menos de 24 horas depois de Babau tirar um passaporte para ir ao Vaticano encontrar-se com o papa Francisco.

A defesa de Babau entrou com um habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o recurso está sobre a mesa do ministro Sebastião Alves dos Reis Junior. Integrante do Programa de Defensores de Direitos Humanos, do governo federal, Babau já sofreu tentativa de homicídio em situação semelhante, além de ameaças de morte e mensagens de ódio racistas.    


A liderança é acusada, com base em depoimentos de pessoas inimigas declaradas do cacique, de liderar um bando que teria assassinado um agricultor. O inquérito correu em tempo recorde, menos de dez dias, desde a morte até a decisão do juiz pela prisão temporária. Sem contraditórios, sem provas, sem efetivo policial suficiente, sem ouvir Babau.

Mesmo com todas estas falhas no inquérito, e as evidências da criminalização política, o cacique afirma não ter nenhum envolvimento com o homicídio e que nunca se sentiu foragido (o mandado de prisão é de 20 de fevereiro), porque não foi informado da ordem e esteve em Brasília três vezes – em uma delas acompanhado pela Polícia Federal –, antes e depois do inquérito.

Outros três mandados de prisão, arquivados em 2010, foram utilizados pela PF para impedir a viagem da liderança. Todavia, estes não possuem efeito, a não ser o de barrar a saída do país de uma liderança que tem muito que denunciar para a comunidade internacional aquilo que se passa com os povos indígenas no Brasil.

Pedimos a sua ajuda. Envie a mensagem abaixo ao ministro Sebastião Alves dos Reis Junior, do STJ, e peça ‘Liberdade pra Babau!’. Acreditamos que a sensibilização do ministro, diante das falhas do inquérito e do equívoco do mandado de prisão, possa restabelecer a justiça.

Envie a mensagem ao e-mail: gmsarj@stj.jus.br


Mensagem

Assunto: Liberdade pra Babau! HC/292982-STJ

Excelentíssimo sr. ministro Sebastião Alves dos Reis Junior, peço ao senhor que defira o habeas corpus 292982, impetrado neste tribunal pela defesa de Rosivaldo Ferreira da Silva, o cacique Babau Tupinambá, liderança da aldeia Serra do Padeiro, na Bahia.

A liderança segue mantida sob a custódia da Polícia Federal, em Brasília, sendo injustamente acusada de um crime que não cometeu. A luta de Babau pela demarcação das terras tradicionais de seu povo, no sul da Bahia, há mais de uma década, motiva criminalizações, ameaças e ataques racistas contra ele e os Tupinambá.

Certo de que o senhor levará em consideração as falhas presentes no inquérito policial, que levou o juiz da Vara Criminal da Justiça de Una a expedir o mandado de prisão contra Babau, pedimos o restabelecimento da justiça e a Liberdade pra Babau!

Atenciosamente,

sexta-feira, 25 de abril de 2014

Juiz determina transferência de cacique Babau para presídio em Ilhéus

Por Renato Santana,
de Brasília (DF)

Cacique Babau Tupinambá, que se apresentou à Polícia Federal (PF) nesta quinta, 24, permanecerá em Brasília, sob custódia, até a transferência ao Presídio Advogado Ariston Cardoso, em Ilhéus (BA). A determinação partiu do juiz substituto Maurício Álvares Barra, da Vara Criminal da Justiça Estadual de Una, o mesmo que no último dia 20 de fevereiro expediu mandado de prisão temporária contra a liderança indígena, com base em inquérito da Polícia Civil.

Logo após a apresentação de Babau, o delegado da PF em Ilhéus, Mário Vinicius Neves, emitiu comunicado sobre a prisão, às 15h30, ao juiz substituto, que uma hora depois respondeu com o conteúdo de sua decisão. Conforme Barra, a transferência do cacique para o presídio baiano tem como objetivo “possibilitar a instrução do inquérito policial”.


A entrega da custódia de Babau, portanto, pode acontecer a qualquer momento, mas o mais provável é que fique para a próxima semana. “A prisão tem motivação política e tememos pela integridade física de Babau. O cacique já sofreu ataques e é ameaçado”, declarou o coordenador do Programa de Defensores de Direitos Humanos da Bahia, ligado à Secretaria de Direitos Humanos do governo federal, José Carvalho.

Depois de ter dois habeas corpus negados pelo Tribunal de Justiça da Bahia, a defesa do cacique aguarda a decisão de um terceiro impetrado no Superior Tribunal de Justiça (STJ), na Capital Federal. O recurso já foi distribuído. Babau é acusado de chefiar um grupo de Tupinambá que teria assassinado um agricultor no último dia 20 de fevereiro. Outros oito indígenas tiveram mandados de prisão decretados, mas ainda não foram capturados.

Tais mandados de prisão do juiz substituto de Una corriam em segredo desde 20 de fevereiro e emergiram apenas com a retirada do passaporte, em Brasília, por Babau, no último dia 16, para viagem ao Vaticano, onde junto ao papa Francisco o cacique faria denúncias de violações dos direitos indígenas no Brasil. Menos de 24 horas depois da emissão do documento, quatro mandados de prisão surgiram: três arquivados desde 2010 e o outro da Justiça de Una.

Babau se entregou aos federais na manhã desta quinta, 24, durante audiência unificada das comissões de Direitos Humanos da Câmara e do Senado, agendada há semanas e que trataria da questão indígena. "Não devo nada. Tupinambá não foge. Vamos até o fim", disse ao chegar no Congresso Nacional. 

Na presença da presidente da Funai, Maria Augusta Assirati, da procuradora da República, Deborah Duprat, Programa de Defensores de Direitos Humanos, parlamentares e organizações indigenistas, o cacique se defendeu das acusações, detalhou a violência sofrida pelos Tupinambá, o problema da morosidade da demarcação da terra indígena e pediu que as autoridades ajudem a proteger sua aldeia e seu povo.  

Inquérito falho   

Entre o assassinato do pequeno agricultor, no último dia 10 de fevereiro, e o mandado de prisão, no dia 20 do mesmo mês, se passaram dez dias. Ou seja, o inquérito policial que baseou a decisão da Justiça foi realizado em menos de dez dias e sem efetivo policial suficiente, ponto declarado pelo próprio juiz, em sua decisão pela prisão, como problemático.

Também, foram ouvidas testemunhas denunciadas pelo próprio cacique e investigadas pela Funai como não-indígenas que se passaram por Tupinambá para acessar benefícios. As próprias testemunhas confessam no inquérito que efetuaram a prática ilegal e ao mesmo tempo, sem provas, acusaram Babau de ser mandante de assassinatos e exigir as orelhas das vítimas. O pior: no inquérito e na decisão do juiz não há o contraditório.

Por outro lado, a delegada de Una, que coordenou o inquérito policial e recomendou a prisão, afirmou não ter encontrado Babau para prestar depoimento. Porém, o cacique esteve em Brasília três vezes, antes ou depois de iniciado o veloz inquérito policial, inclusive em companhia de agentes da Polícia Federal. Integrantes das Forças Armadas também estiveram com Babau na aldeia Serra do Padeiro.

“Eu faço parte do Programa de Defensores de Direitos Humanos do governo. Todo mundo sabe onde eu estou. Como uma delegada que está me investigando não sabe? Nunca estive foragido e tampouco fui informado disso. Acho muito estranho eu não ter sido encontrado e nem a Funai ter sido procurada”, declarou cacique Babau pouco antes de entrar na custódia da PF.

quinta-feira, 24 de abril de 2014

Nota da CNBB sobre a viagem do índio Tupinambá ao Vaticano

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) divulgou hoje, 24, nota sobre a viagem do índio Tupinambá ao Vaticano. O texto, assinado pelo bispo auxiliar de Brasília e secretário geral da CNBB, dom Leonardo Steiner, explica que o cacique Babau Tupinambá viajaria ao Vaticano junto com o arcebispo de Aparecida (SP) e presidente da CNBB, cardeal Raymundo Damasceno Assis, para participar da missa de ação de graças pela canonização do padre José de Anchieta, que esteve presente entre o povo Tupinambá. "A representação do povo Tupinambá teria um significado especial na celebração em Roma", afirma dom Leonardo. Leia, na íntegra, a nota: 


A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB lamenta a impossibilidade da viagem ao Vaticano do índio Rosivaldo Ferreira da Silva, conhecido como cacique Babau Tupinambá.
Babau foi convidado pela CNBB para participar da missa de ação de graças pela canonização do Padre José de Anchieta, celebrada hoje, 24 de abril, na Igreja de Santo Inácio de Loyola, em Roma. A missa foi presidida pelo Papa Francisco.

O índio viajaria à Itália junto com o arcebispo de Aparecida (SP) e presidente da CNBB, Cardeal Raymundo Damasceno Assis, no último dia 23. São José de Anchieta esteve entre o povo Tupinambá. O cacique Babau pretendia apresentar ao Santo Padre documentos sobre as violações dos direitos indígenas no Brasil, sobretudo com relação ao povo Tupinambá.

Com o passaporte suspenso, Babau foi impedido de viajar devido a um mandado de prisão temporária, expedido, no dia 20 de fevereiro, pelo juiz substituto da Vara Criminal de Una, na Bahia. O mandado não foi executado, tendo o cacique Babau moradia fixa.

Hoje, 24, cacique Babau participou da audiência unificada das comissões de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, em Brasília, e, em seguida, apresentou-se à Polícia Federal, em Brasília.

Esperamos que as acusações sejam investigadas de modo justo, sem mais prejuízos ao povo Tupinambá, que sofre com a questão da regularização das terras no sul do Bahia.
A representação do povo Tupinambá teria um significado especial na celebração em Roma.

Leonardo Ulrich Steiner
Bispo Auxiliar de Brasília
Secretário Geral da CNBB

Cacique Babau Tupinambá se entrega à Polícia Federal na Câmara Federal

Imagem de internet (ilustração do Blog)
O cacique Babau Tupinambá decidiu se entregar à Polícia Federal na manhã desta quinta, 24, durante audiência unificada das comissões de Direitos Humanos da Câmara e do Senado, no Congresso Nacional, em Brasília (DF). A prisão temporária da liderança foi decretada pela Vara Criminal da Justiça Estadual de Una, município baiano.  

“Tiraram nós do nosso território e agora continuamos no mesmo impasse. Estão querendo nos matar. Querendo, não, estão nos matando. Quero que este parlamento ou nos mate de uma vez ou faça alguma coisa. Daqui eu vou sair pra prisão, daqui a pouco”, disse Babau ao chegar à Câmara Federal. Babau disse ainda que não irá fugir: "Não devo nada. Tupinambá não foge. Vamos até o fim".


Depois de tentar viajar nesta quarta, 23, ao Vaticano para encontro com o papa Francisco, a convite da CNBB, o passaporte de Babau foi suspenso pela Polícia Federal, menos de 24 horas depois de emitido, por quatro mandados de prisão: três arquivados em 2010 e outro da Justiça Estadual de Una acusando-o de participação no assassinato de um pequeno agricultor, pelo qual agora Babau é levado para a carceragem da Polícia Federal.  

Entre o assassinato do pequeno agricultor, no último dia 10 de fevereiro, e o mandado de prisão, no dia 20 do mesmo mês, se passaram dez dias. O inquérito policial que baseou a decisão da Justiça foi realizado em tempo recorde e sem efetivo policial suficiente, como declarou o próprio juiz em sua decisão pela prisão.

Também, foram ouvidas testemunhas denunciadas pelo próprio cacique e investigadas pela Funai como não-indígenas que se passaram por Tupinambá para acessar benefícios. As próprias testemunhas confessam no inquérito que efetuaram a prática ilegal.

Por outro lado, a delegada de Una que coordenou o inquérito policial e recomendou a prisão de Babau afirmou não tê-lo encontrado para prestar depoimento. Porém, o cacique esteve em Brasília três vezes, antes ou depois de iniciado o veloz inquérito policial, inclusive em companhia de agentes da Polícia Federal.

Fonte: Cimi/DF

PURA ENGENHARIA EM CRUZEIRO DO SUL: Obra de mais de três milhões de Reais

Exemplo de engenharia eficiente (foto Lindomar Padilha)
Vejam vocês que exercício de engenharia teve que fazer o engenheiro responsável pelas obras de reforma da praça central em Cruzeiro do Sul, Estado do Acre, para conseguir colocar o balanço justamente na única entrada de acesso aos demais brinquedos do parquinho infantil. Com essa verdadeira sumidade em se tratando de obras públicas, não há o que dizer mais. Aí está manifesta a real preocupação que se tem com os bens públicos e seus usuários.

Foto:Lindomar Padilha
É tão evidente que este balanço está em local errado que não seria necessário eu postar isso aqui. A prefeitura deveria ter mandado trocar a porta de acesso, ou a ordem dos brinquedos imediatamente. A RM, construtora responsável, deveria chamar o engenheiro e o encarregado e exigir pedido de desculpas públicas, além de um curso de reciclagem. Afinal, a obra foi orçada em mais de três milhões de reais.

É por essas e outras que, quando volta a minha querida Cruzeiro do Sul, prefiro levar meus filhos aos belíssimos banhos  do Môa, Boca da Alemanha, Igarapé Preto e, claro, sítios dos meus amigos... afinal, nada melhor que saborear um belo peixe moqueado em ótimas companhias!

Foto: Lindomar Padilha



quarta-feira, 23 de abril de 2014

Via Campesina protocola no MJ moção de repúdio à Minuta que modifica demarcações

A Via Campesina, movimento internacional que reúne organizações camponesas de pequenos agricultores, trabalhadores agrícolas, mulheres e comunidades indígenas, irá protocolar na manhã desta quarta-feira (23), no Ministério da Justiça (MJ), uma moção de repúdio à Minuta de Portaria do MJ que pretende regulamentar o Decreto nº1775/96 (leia aqui), que trata da demarcação das terras indígenas, modificando o procedimento.
Caso a Minuta seja efetivada, grupos contrários à demarcação dos territórios indígenas terão livre acesso para interferir desde os primeiros momentos do procedimento de identificação e delimitação dessas terras, lesando o cerne dos direitos dos povos indígenas, garantidos constitucionalmente.
“A publicação e efetivação das medidas contidas na Minuta podem acirrar intensamente os conflitos, favorecer uma parcela de pecuaristas, latifundiários, produtores rurais e grileiros de terras, inimigos históricos dos índios. [...] Não se pode aceitar que o Governo do Brasil assuma posição tão aberta e insultuosa, injuriosa e ultrajante aos Povos Indígenas através de atos normativos e de políticas regulatórias em desfavor dos povos originários, como pretende com o que propõe a regulamentação do Decreto 1775/96.”, diz trecho do documento da Via Campesina.
Um parecer jurídico (leia aqui) analisando os principais equívocos constitucionais da Minuta de Portaria foi entregue ao Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, no início de abril, durante sessão da 9º reunião extraordinária da Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI), em Brasília (DF). A Via Campesina também manifesta no documento sua adesão ao parecer, elaborado por organizações indígenas e indigenistas e apoiado por NUMERO instituições (...).
Para assinar o parecer contra a Minuta do MJ é necessário enviar uma mensagem de adesão ao endereço eletrônico apib.nacional@gmail.com. As assinaturas serão anexadas e enviadas às autoridades.
No Brasil, além do MAB, as demais organizações da Via Campesina também assinaram o parecer contra a minuta - ABEEF, CIMI, CPT, FEAB, MPA, MMC, MST, PJR, MPP, APIB, SINPAF, ADERE, ENEBio, CONAQ e MAM. 
Fonte da notícia: Assessoria de Comunicação - Cimi

sábado, 19 de abril de 2014

Com mandados de prisão, Polícia Federal tenta impedir ida de Babau Tupinambá ao Vaticano

Por Renato Santana,
de Brasília (DF)
Menos de 24 horas depois de receber um passaporte para viajar ao Vaticano e se encontrar, durante celebração, com o papa Francisco, a convite da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Rosivaldo Ferreira da Silva, o cacique Babau Tupinambá, da Bahia, está sendo impedido pela Polícia Federal (PF) de sair do país por conta de três mandados de prisão. Porém, as ordens judiciais estão arquivadas desde 2010. A PF diz que tais mandados não estão revogados.
Para a liderança indígena, o governo federal, por intermédio de sua polícia, tenta impedir o encontro dele com o papa Francisco. “O governo não quer que eu denuncie o que vem acontecendo com os povos indígenas no Brasil. A Polícia Federal não sabe que os três mandados foram arquivados e nem processo existe? Claro que sabe! O governo sabe disso!”, protesta cacique Babau.
Outro mandado de prisão teria sido expedido contra Babau nesta quinta. De acordo com informações extra-oficiais, obtidas junto a PF, em Brasília, a Polícia Civil do município de Una (BA) pediu apoio aos agentes federais na Capital Federal para efetuar a prisão de Babau. Este suposto mandado de prisão, emitido pela Justiça Estadual de Una, pede a prisão temporária do cacique. Porém, não há confirmação no sistema judicial dessa ordem e a que processo ela se refere.
Coincidência ou não este mandado acontece exatamente na ocasião da viagem de Babau ao Vaticano, que nada tem de turismo, e junto com o impedimento gerado pela PF. Na tarde desta quarta, 16, o passaporte de Babau foi emitido por um agente de imigração da PF no aeroporto de Brasília. Representantes da Funai e do Cimi acompanharam a liderança indígena. Conforme o agente, nada estava pendente e sem mais questionamentos emitiu o documento para o cacique.
Entretanto, depois da liberação do documento, a opinião da PF mudou. De acordo com mensagem da Coordenação-geral da Polícia de Imigração ao agente, em resposta ao encaminhamento do passaporte, “não identificamos, até a presente data, documento que informe a baixa/revogação destes (três) mandados de prisão”.
Os três mandados federais, então, serviram de justificativa para a Polícia Federal pedir de volta, na manhã desta quinta, 17, o passaporte entregue menos de 24 horas antes sem qualquer restrição dos próprios federais. O aviso era de que se a situação não fosse regularizada até o início da tarde, com a revogação dos mandados, o passaporte estaria suspenso. Caso cacique Babau não entregasse o documento e tentasse embarcar para Roma, seria preso no aeroporto.
“Querem me impedir de todas as formas de ir para o encontro com o Papa. É uma rede contra a demarcação das terras Tupinambá, contra os indígenas. Não querem que denunciemos ao mundo o que se passa aqui. Isso não é democracia, é ditadura. Como pode se instalar um estado de exceção assim, sem mais nem menos?”, questiona cacique Babau.
Convite da Igreja    
 A ida de Babau ao Vaticano é parte de um convite feito pela CNBB para que o cacique participe de uma celebração relativa à canonização do padre José Anchieta. Na oportunidade, o Babau levaria ao papa documentos e mensagens sobre a questão indígena no Brasil, denunciando violações de direitos humanos e a paralisação da demarcação de terras.
O cacique levaria também em sua mala presentes ao papa oriundos da Serra do Padeiro, uma das mais de 20 aldeias que compõem a Terra Indígena Tupinambá de Olivença, que espera a assinatura da portaria declaratória pelo ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, desde 2011. 
Histórico de violências
 O histórico recente de violências por parte do Estado contra os Tupinambá é vasto, tanto quanto de fazendeiros e pistoleiros. De prisões arbitrárias, abuso de força policial, torturas, destruição de casas, veículos comunitários, alimentos e equipamento escolar a lista de acusações contra o Estado parece interminável. 
 Foi assim que a Polícia Federal impôs sistematicamente, por ordem de decisões judiciais ou outras motivações nem tão claras para os indígenas, pressão aos Tupinambá para que deixassem as áreas retomadas. As ações recaíram principalmente contra o cacique Babau e seus familiares.
 A seguir, uma lista cronológica e atualizada das violências sofridas pelos Tupinambá nos últimos seis anos – tanto da PF quanto de pistoleiros e fazendeiros:
17 de abril de 2008
Primeira prisão do cacique Babau, acusado de liderar manifestação da comunidade contra o desvio de verbas federais destinadas a saúde. O cacique estava em Salvador no momento dos fatos.
23 de outubro de 2008
Ataque da PF na aldeia da Serra do Padeiro, com mais de 130 agentes, 2 helicópteros e 30 viaturas – para cumprimento de mandados judiciais suspensos no Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região e contra orientação do Ministério da Justiça, resultando em 22 indígenas feridos a bala de borracha e intoxicação por bombas a gás, destruição de casas, veículos comunitários, alimentos e equipamento escolar.
27 de maio de 2009
Prisão preventiva do irmão do cacique Babau, por dirigir carro da Funasa carregando mantimentos. O Desembargador Cândido Ribeiro, do TRF da 1ª Região, não encontrou justificativa na ordem de prisão, da Justiça Federal de Ilhéus.
2 de junho de 2009
Cinco pessoas foram capturados e torturadas por agentes da PF – spray de pimenta, socos, chutes, tapas, xingamentos e choque elétrico. Os laudos do IML/DF comprovaram a tortura, mas o inquérito concluiu o contrário.
10 de março de 2010
Cacique Babau é preso, durante a madrugada, em invasão da PF em sua casa, embora a versão dos agentes – comprovadamente falsa – informe que a prisão teria acontecido no horário permitido pela lei.
20 de março de 2010
Prisão do irmão do cacique Babau, por agentes da PF em plena via pública, enquanto levava um veículo de uso comunitário da aldeia para reparo.
16 de abril de 2010
Babau e seu irmão são transferidos para a penitenciária de segurança máxima em Mossoró (RN), por receio da PF de ver manifestações diante de sua carceragem em Salvador pela passagem do “Dia do Índio”, em desrespeito ao Estatuto do Índio.
3 de junho de 2010
A irmã de Babau e seu bebê de dois meses são presos na pista do aeroporto de Ilhéus pela PF, ao voltar de audiência com o presidente Lula, na Comissão Nacional de Política Indigenista, por decisão do juiz da comarca de Buerarema. Permanecem presos em Jequié por dois meses, até o próprio juiz resolver revogar a ordem de prisão.
5 de abril de 2011
Estanislau Luiz Cunha e Nerivaldo Nascimento Silva foram presos numa situação de “flagrante preparado” – prática considerada ilegal– num areal explorado por empresas, de dentro da Terra Indígena Tupinambá. Acusados baseados em meros indícios dos crimes de “extorsão” pela PF, Estanislau – que toma remédios controlados – e Nerivaldo – que teve a perna direita amputada, após baleamento por agente da PF – respondem ainda por “tentativa de homicídio” contra policiais federais. Coincidentemente, a ação foi feita na véspera da chegada do Secretario de Justiça do estado da Bahia, à região. Após dois meses e meio presos, o TRF da 1ª Região lhes concedeu a liberdade por 3 x0 em julgamento de habeas corpus, em 20 de junho.
3 de fevereiro de 2011
Prisão da Cacique Maria Valdelice, após depor na Delegacia da Polícia Federal em Ilhéus, em cumprimento ao Mandado de Prisão expedido pelo Juiz Federal Pedro Alberto Calmon Holliday, acusada de “esbulho possessório”, “formação de quadrilha ou bando” e “exercício arbitrário das próprias razões”. A cacique foi libertada no final do mês de junho, após cumprir quatro meses em prisão domiciliar.
14 de abril de 2011
Por volta das 5h da manhã, fortemente armados e com mandado de busca e apreensão, vários agentes da PF vasculham a residência da cacique Valdelice, assustando toda a família – principalmente os muitos netos da cacique. Em Salvador, chegava para reuniões com autoridades locais a “Comissão  Tupinambá” do CDDPH.
15 de abril de 2011
Fortemente armada, a PF acompanha oficiais de justiça em cumprimento de mandado de reintegração de posse. Indígenas e Funai não haviam sido previamente intimados do ato, que foi presenciado pelos membros do CDDPH, que testemunharam o despreparo de agentes e a presença de supostos fazendeiros que incitavam as autoridades contra os indígenas.
28 de abril de 2011
A Polícia Federal instaura o inquérito, intimando o procurador federal da AGU e os servidores da Funai a prestar depoimento sobre denúncia de “coação” contra a empresária Linda Souza, responsável pela exploração de um areal, situado na terra Tupinambá.
29 de abril de 2011
Prisão do cacique Gildo Amaral, Mauricio Souza Borges e Rubenildo Santos Souza, três dias antes da delegação composta por deputados federais da CDHM e membros do CDDPH/SDH visitarem novamente os povos indígenas da região por causa das violências que continuam a ser denunciadas.
5 de julho de 2011
Cinco Tupinambá são presos pela PF sob as acusações de “obstrução da justiça” e “exercício arbitrário das próprias razões”, “formação de quadrilha” e “esbulho possessório”.
18 de outubro de 2012
No Fórum de Itabuna (BA), cinco Tupinambá, vítimas de tortura cometidas por policias federais, prestaram depoimento ao juiz Federal em parte do procedimento da Ação Civil Pública por Dano Moral Coletivo e Individual movida pelo Ministério Público Federal (MPF) da Bahia contra a União. Os procuradores abriram inquérito também para apurar os responsáveis pela tortura, atestada e comprovada por laudos do Instituto Médico Legal (IML). 
14 de agosto de 2013
Estudantes da Escola Estadual Indígena Tupinambá da Serra do Padeiro foram vitimas de emboscada na estrada que liga Buerarema a Vila Brasil. O atentado ocorreu quando o caminhão (foto acima) que transportava os alunos do turno da noite para as suas localidades foi surpreendido por diversos tiros oriundos de um homem que se encontrava em cima de um barranco. Os tiros foram direcionados para a cabine do veículo, numa clara tentativa de atingir o motorista, que com certeza o atirador achava ser Gil, irmão do cacique Babau, pois  o carro é de sua propriedade. Quem conduzia o carro era Luciano Tupinambá.
26 de agosto de 2013
No município de Buerarema, contíguo ao território tradicional Tupinambá, atos violentos promovidos por grupos ligados aos invasores da terra indígena. Indígenas foram roubados enquanto se dirigiam à feira e 28 casas foram queimadas até o início de 2014. O atendimento à saúde indígena foi suspenso e um carro da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) foi queimado.
8 de novembro de 2013
Aurino Santos Calazans, 31 anos, Agenor de Souza Júnior, 30 anos, e Ademilson Vieira dos Santos, 36 anos, foram executados em emboscada quando regressavam da comunidade Cajueiro, por volta das 18 horas, na porção sul do território Tupinambá, quando foram emboscados por seis homens. Disparos de arma de fogo foram feitos contra os indígenas. Na sequência os assassinos praticaram torturas, dilaceraram os corpos com facões e com o que é chamado na região de “chicote de rabo de arraia”. Procuradores federais apontam assassinatos como parte do conflito pela terra.
 28 de janeiro de 2014
Após realizar a reintegração de posse de duas fazendas localizadas na Serra do Padeiro, no município de Ilhéus, na Bahia, policiais federais e da Força Nacional montaram uma base policial na sede da fazenda Sempre Viva. Ataques com granadas contra os Tupinambá refugiados na mata.
2 de fevereiro de 2014
 Durante invasão da Polícia Federal em aldeia Tupinambá da Serra do Padeiro, M.S.M, de 2 anos, em fuga para a mata, se desgarrou dos pais e acabou nas mãos dos policiais. O delegado Severino Moreira da Silva, depois da criança ter sido levada para Ilhéus pelos federais, a encaminhou para o Conselho Tutelar que, por sua vez, transferiu o menor para uma creche, onde ele segue longe dos pais e isolado por determinação da Vara da Infância e Juventude.


terça-feira, 15 de abril de 2014

Denúncia feita ao Papa: “Grupos político-econômicos buscam desconstruir os direitos territoriais dos povos indígenas”. Entrevista especial com Dom Erwin Kräutler

“Denunciei ao Papa que, contrariando o que determina a Constituição Brasileira, o atual governo suspendeu os procedimentos administrativos de reconhecimento e demarcação de terras indígenas no país”, narra o Bispo do Xingu.
Foto: Cultura Indigena 
A maior diocese do Brasil fica no Xingu e soma aproximadamente 800 comunidades, mas tem apenas 27 padres. Fora essa desproporção, a região conta com muitos desafios à defesa dos direitos dos indígenas e, também, ao trabalho da Igreja na Amazônia. Ambos os temas foram tratados no encontro de Dom Erwin KräutlerBispo do Xingu, com o papa Francisco, no último dia 4 de abril.
“Agradeci o privilégio de ser recebido em audiência como bispo do Xingu, que é a maior circunscrição eclesiástica doBrasil em extensão territorial. (...) Como em toda a Amazônia, também no Xingu as comunidades, em sua imensa maioria, só têm acesso à celebração eucarística dominical duas ou três vezes ao ano”, conta Dom Erwin Kräutler, em entrevista por e-mail à IHU On-Line.
“Denunciei que existem hoje grupos político-econômicos ligados ao agronegócio, a mineradoras e empreiteiras, com apoio e participação do governo brasileiro, que buscam desconstruir os direitos territoriais dos povos indígenas e, para conseguir tal objetivo, utilizam sistematicamente instrumentos político-administrativos, judiciais e legislativos”, argumenta Dom Erwin.
“E neste contexto falei dos empreendimentos desenvolvimentistas que causam um verdadeiro caos social e ambiental. Citei como exemplo a hidrelétrica Belo Monte, no Xingu. Todas as apreensões técnicas manifestadas por especialistas não conseguiram convencer o governo brasileiro a desistir desse megaprojeto. Em torno de 40 mil pessoas são diretamente atingidas por Belo Monte e terão que deixar suas casas”, complementa.
Dom Erwin Kräutler é Bispo do Xingu e presidente nacional do Conselho Indigenista Missionário – CIMI.
Foto: Plattform Belo Monte
Confira a entrevista.
IHU On-Line - Como foi seu encontro com o Papa Francisco? Sobre quais assuntos conversaram? Belo Monte e a situação da população do Xingu foram temas abordados pelo senhor?
Dom Erwin Kräutler - O encontro com o Papa Francisco tinha a ver com minha função de Secretário da Comissão Episcopal para a Amazônia. O nosso Cardeal Dom Claudio Hummes, que é presidente desta comissão, incentivou-me a solicitar uma audiência particular com o Papa para falar-lhe da minha vida e da experiência na Amazônia e, como testemunha que conhece a Amazônia há meio século, colocá-lo a par de nossas preocupações como Igreja nesta região. Mas sou também Presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), já no quarto mandato. E com esta responsabilidade me senti realmente na obrigação de partilhar com o nosso Papa Francisco a realidade em que vivem os povos indígenas no Brasil, seus sofrimentos e angústias.
A audiência estava marcada para as 10 horas do dia 4 de abril de 2014. Eu havia convidado o Padre Paulo Suess, assessor teológico do Cimi e profundo conhecedor da Causa Indígena no Brasil e na América Latina, a acompanhar-me nesta audiência para que o pudesse apresentar ao Papa. Após saudarmos o Papa e as fotos de praxe, o Padre Paulo Suess ofereceu-lhe seu Dicionário de Aparecida - 40 palavras-chave para uma leitura pastoral do Documento de Aparecida (São Paulo: Paulus, 2007) e mais um texto que redigiu sobre as comunidades sem Eucaristia. Aí oPapa falou logo que esperava sugestões concretas, propostas corajosas dos bispos como ele já havia pedido em 27 de julho de 2013, por ocasião de sua visita ao Brasil, na Jornada Mundial da Juventude: “Peço, por favor, para serem corajosos, para terem parrhesia! No jeito ‘portenho’ (de Buenos Aires) de falar, lhes diria para serem ‘corajudos’”.
Comunidades sem Eucaristia
Papa convidou-me então a sentar. Agradeci o privilégio de ser recebido em audiência como bispo do Xingu, que é a maior circunscrição eclesiástica do Brasilem extensão territorial. Há no Xingu em torno de 800 comunidades e apenas 27 padres. Como em toda a Amazônia, também noXingu as comunidades, em sua imensa maioria, só têm acesso à celebração eucarística dominical duas ou três vezes ao ano. É muito doloroso para mim, como bispo, conviver com essa realidade. De repente o Papa me perguntou: “O que pensa ou qual a sua proposta neste sentido?”. Jamais esperava que o Papa quisesse ouvir a minha opinião, e disse: “Não tenho uma ‘receita’ pronta, mas precisamos com urgência encontrar uma solução para que o nosso povo deixe de ser excluído daEucaristia”. O Papa me respondeu então que havia algumas “teses interessantes”, por exemplo, a de um bispo alemão que foi bispo na África do Sul. Trata-se deDom Fritz Lobinger (*1929), que de 1987 a 2004 foi bispo da Diocese de Aliwal. Seu livro Altar vazio. As comunidades podem pedir ordenação de ministros próprios (Aparecida: Editora Santuário, 2010) foi traduzido em várias línguas. Dom Fritz Lobinger sonha com ministros ordenados que pertencem à comunidade e continuam a vida de família e profissional. O papa lembrou ainda uma diocese no México onde, nas muitas etnias indígenas, há centenas de diáconos casados que exercem seu ministério junto ao seu povo e presidem as suas comunidades. Só lhes falta a ordenação sacerdotal para poder presidir também a celebração eucarística. É a diocese de San Cristobal de Las Casas, no estado de Chiapas. Mais uma vez o papa Francisco insistiu que os bispos de determinada região apresentassem propostas bem concretas e corajosas. Disse-me que esperava e aguardava tais propostas dos bispos.
Lembrou o grande José de Anchieta, agora “São José de Anchieta”. Quem sabe, esse santo, que chegou das Ilhas Canárias ao Brasil com menos de 20 anos e nunca mais voltou à sua terra natal, pode fomentar nas dioceses brasileiras com número suficiente de padres o espírito missionário rumo à Amazônia.
Vi os olhos do Papa brilharem quando falou dos missionários e missionárias na Amazônia. Recordou-me que o Cardeal Dom Claudio Hummes havia lhe falado a respeito de tantos bispos e padres, religiosas e religiosos, leigas e leigos engajados na evangelização desta região de extensão continental e expressou a todos seu carinho e sua admiração.
Os Povos Indígenas no Brasil
Passei então à questão dos povos indígenas. Falei do Cimi, da sua presença junto aos povos indígenas e também de seu objetivo de sensibilizar e conscientizar a sociedade majoritária a respeito da dignidade e dos direitos destes povos. Disse que o Cimi contribuiu decisivamente para que os índios tenham reconhecido na Carta Magna do Brasil“sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e o direito originário às terras que tradicionalmente ocupam” (artigo 231 da Constituição Brasileira). Denunciei que existem hoje grupos político-econômicos ligados ao agronegócio, a mineradoras e empreiteiras, com apoio e participação do governo brasileiro, que buscam desconstruir os direitos territoriais dos povos indígenas e, para conseguir tal objetivo, utilizam sistematicamente instrumentos político-administrativos, judiciais e legislativos.
Denunciei ainda que, contrariando o que determina a Constituição Brasileira, o atual governo suspendeu os procedimentos administrativos de reconhecimento e demarcação de terras indígenas no país. A paralisação das demarcações é uma das principais causas de conflitos de que os povos indígenas são vítimas. Citei alguns exemplos que comprovam a violência contra os povos indígenas. Falei do confinamento dos Guarani-Kaiowá numa área tão diminuta que resulta em mortes, suicídios e sofrimento atroz e permanente. Lembrei também a precária assistência à saúde por parte do Estado Brasileiro, especialmente na Terra Indígena Vale do Javari, no estado doAmazonas; 85% dos indígenas tiveram contato ou estão contaminados por um ou mais vírus da hepatite. Não podia deixar de referir-me também aos aproximadamente 90 grupos de povos indígenas na Amazônia brasileira em situação de isolamento, muitos deles correndo risco de dizimação.
Finalmente recordei o encontro do Papa com indígenas por ocasião da Jornada Mundial da Juventude, quando um índio lhe colocou um lindo cocar na cabeça e outro índio-pataxó de apenas 14 anos exclamou: “É fantástico que alguém da nossa comunidade teve oportunidade de conhecer o papa. Nós aqui estamos representando todos os índios do Brasil“. Vários indígenas da Amazônia disseram, naquele dia, que esperavam a ajuda do Papa na defesa de suas terras ancestrais.
Amazônia e a Ecologia
Com uma outra recordação que fiz ao papa, passamos para a questão da Ecologia. Lembrei-lhe o que havia falado aos bispos do Brasil em seu discurso de 27 de julho de 2013: “Queria convidar todos a refletirem sobre o queAparecida disse a propósito da Amazônia, incluindo o forte apelo ao respeito e à salvaguarda de toda a criação queDeus confiou ao homem, não para que a explorasse estupidamente, mas para que ela se tornasse um jardim”. E neste contexto falei dos empreendimentos desenvolvimentistas que causam um verdadeiro caos social e ambiental. Citei como exemplo a hidrelétrica Belo Monte no Xingu. Todas as apreensões técnicas manifestadas por especialistas não conseguiram convencer o governo brasileiro a desistir desse megaprojeto. Em torno de 40 mil pessoas são diretamente atingidas por Belo Monte e terão que deixar suas casas.
Papa me disse então que está pensando numa encíclica sobre a ecologia e enfatizou: “também a ecologia humana”. Tem toda a razão. Não podemos separar a família humana do meio ambiente em que vive ou abstrair o meio ambiente dos homens e mulheres responsáveis pela criação de Deus, o lar de toda a humanidade, também das futuras gerações. Insisti dizendo que nesta futura encíclica a Amazônia e os Povos Indígenas não podem ficar ausentes. O Papa me revelou que já havia encarregado o cardeal africano Peter Turkson, presidente do Pontifício Conselho Justiça e Paz, a elaborar um esboço. Respondi ao Papa: “Pois é, estive ontem com o Cardeal Turkson por várias horas e um dos assuntos foi exatamente este. Insisti que a Amazônia e os Povos indígenas não faltassem numa futura encíclica sobre ecologia. E o cardeal me pediu que o ajudasse nestes pontos. Aceitei o convite com muita alegria”. O Papa acenou contente e agradeceu minha disponibilidade de colaborar.
O abraço do Povo do Xingu
Finalmente falei ao Papa que o meu povo do Xingu lhe quer muito bem e o abraça carinhosamente: “Devo transmitir-lhe o abraço de milhares e milhares de mulheres e homens”. Aí ele disse que retribuía o abraço e, sorrindo, me encarregou de dar, em nome dele, um abraço a cada uma, a cada um dos irmãos e das irmãs na Prelazia do Xingu.
Já na despedida pediu ao povo do Xingu que rezasse muito por ele. Lembrei-me do momento em que apareceu, pela primeira vez como Papa, na sacada da Basílica de São Pedro e, antes de dar sua primeira bênção, pediu a oração do povo de Roma e do mundo inteiro. Assim também pediu, primeiro, orações para depois enviar sua bênção ao povo do Xingu. Agradeci mais uma vez o privilégio de receber-me em audiência e beijei o seu tão simples Anel de Pescador. Em seguida, o Papa me acompanhou gentilmente até a porta.
IHU On-Line - Quais suas impressões da conversa com o Papa Francisco?
Dom Erwin Kräutler - O Papa Francisco é muito cordial, fraterno. Seu sorriso não tem nada de postiço. É a vitrine de sua alma e seu coração. Quem se encontra com ele, logo se sente acolhido. Mesmo que no Palácio Apostólico se respire o ar de muitos séculos passados e as tantas salas com tronos e obras de arte que parecem mais um museu, quando entrei na biblioteca e o Papa veio ao meu encontro e com um cordial sorriso me estendeu a mão, percebi que estou “em casa”. Quem cria um ambiente tão afável e acolhedor não são as obras de arte, mas a pessoa do Papa Francisco.
Não sei por que, mas durante a nossa conversa, de repente me veio à mente a figura de Moisés que tirou o povo da casa da escravidão para levá-lo à Terra Prometida. Teve de suportar lancinantes decepções, incompreensão, maledicência aberta e velada, até a revolta do povo a ponto de querer retornar à terra de que Deus o tirou “com mão forte e braço estendido” (Dt 4,34; 26,8). Mas Moisés, em meio a todas as frustrações, deixou-se conduzir pelo Senhor, foi em frente, passo a passo. E por quê? Uma profunda mística o alimentou e manteve firme, também em horas de trevas mais espessas. Nunca esqueceu o que Deus lhe falou na alvorada do Êxodo: “Eu estarei contigo” (Ex 3,12). “O Senhor o conhecia face a face” (Dt 34,10) é o derradeiro comentário sobre Moisés no Livro do Deuteronômio. Penso que o Papa vive uma mística semelhante. Sabe que Deus está com ele e essa certeza da presença de Deus em sua vida é o segredo de seu sorriso cativante.
IHU On-Line - Como o senhor descreveria a reação das pessoas, em geral, e da Igreja, em particular, na Europa, e, especialmente, na Áustria, do pontificado de Francisco?
Dom Erwin Kräutler - Vivo há quase 50 anos no Xingu e por isso não me atrevo a fazer análises a respeito das Igrejas na Europa, nem sequer na Áustria, onde nasci. Deixo isso com os pastoralistas de lá. Mas pelos meus contatos com padres e bispos e pessoas mais engajadas, percebo que há um profundo sentimento de gratidão a Deus e uma incontida alegria por termos esse papa. Não se espera dele que de hoje para amanhã consiga fazer as reformas, há tempo necessárias, mas há uma imensa esperança de que o Papa Francisco dê uma guinada em nossa Igreja.
Alguns são impacientes e querem que o Papa tome decisões “já” em relação às na Europa chamadas “Heisse Eisen” (questões escaldantes), como as normas para admissão ao sacerdócio, o celibato, o papel da mulher naIgreja, o processo para escolha de bispos, a comunhão para casados em segundas núpcias.
Existem também pessoas que, ao que parece, insistem em continuar nos tempos do Concílio de Trento (1545-1563). Não aceitam o modo simples, humilde, acolhedor do papa e, pior, questionam até a sua teologia, seus apelos à misericórdia e duvidam de sua ortodoxia arvorando-se em defensores da fé católica. Graças a Deus é uma minoria numericamente insignificante, mas é gente fanática, intransigente, birrenta que dá dó.
IHU On-Line - Quais são as expectativas quanto ao Sínodo Extraordinário para a Família na Europa? E no Brasil?
Dom Erwin Kräutler - As expectativas são enormes, especialmente depois da pesquisa realizada pela Santa Sé no mundo inteiro. O Sínodo Extraordinário terá uma tarefa homérica a cumprir e as discussões sinodais, sem dúvida, serão acaloradas, o que não deixa de ser positivo quando se buscam respostas aos anseios de milhões e milhões de famílias que aguardam deste Sínodo linhas, diretrizes, orientações.
O discurso proferido pelo cardeal Walter Kasper no Consistório dos Cardeais, em 20 de fevereiro de 2014, pode ser um excelente ponto de partida para as discussões na ala sinodal, especialmente numa questão muito candente como o acesso à comunhão eucarística de divorciados em segundas núpcias. Walter Kasper lembra, em seu discurso, o que o Papa Francisco falou em 24 de janeiro de 2014 aos oficiais do Tribunal da Rota Romana (a instância superior de apelação na Sé Apostólica). O papa afirma que “a pastoral e a misericórdia não se contrapõem à justiça, mas, por assim dizer, são a justiça suprema, porque por trás de cada causa elas avistam não só um caso a ser examinado na ótica de uma norma geral, mas sim uma pessoa humana que, como tal, nunca pode tornar-se um mero caso e sempre tem uma dignidade única“.

Espero que haja realmente diálogo. No Sínodo para a América em que participei, em 1997, como delegado da CNBB, não havia suficiente espaço para trocar ideias, discutir pontos de vista. Faço votos de que finalmente se crie um organograma e fluxograma favoráveis ao diálogo.
E espero ainda que neste sínodo não sejam apenas os padres sinodais, cardeais e bispos que tenham voz, mas que casais e famílias sejam convidados e ouvidos, inclusive pessoas cujo matrimônio fracassou e pedem compaixão e misericórdia para sua situação dolorosa e muitas vezes irreversível.