quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Marcha indígena em Mato Grosso do Sul, contra o genocídio e impunidade


A Marcha contra o Genocídio e pela Paz, organizada pelo movimento político Kaiowá Guarani Aty Guasu, reuniu nesta quarta-feira cerca de 500 pessoas que caminharam sete quilômetros - pela rodovia MS 386 entre Amambai e Ponta Porá, Mato grosso do Sul - até o local do acampamento Tekoha Guaiviry, onde foi morto, no último dia 18, o líder político e religioso Nísio Gomes.

“Foi muito boa a marcha. Superou as nossas expectativas porque com todo esse sofrimento e o medo de acontecer alguma coisa, realmente mostramos que estamos fortes”, avaliou Otoniel Kaiowá Guarani, membro do Aty Guasu. Todos os povos do estado participaram da marcha, sobretudo indígenas dos 31 acampamentos espalhados pelo MS, tal como o Tekoha Guaiviry. 

O protesto pediu a investigação rigorosa e a prisão dos criminosos que realizaram o crime. No acampamento, integrantes da marcha visitaram o local do triste episódio que culminou no desaparecimento de Nísio. No último fim de semana, a Aty Guasu, em reunião extraordinária, divulgou manifesto pedindo intervenção federal em Mato Grosso do Sul, em função da incapacidade do estado de garantir a segurança dos indígenas.

A marcha contou com o apoio das seguintes entidades do movimento indígena regional e nacional: Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (Arpinsul), Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), Associaçao Kaguateca Marçal de Souza, Movimento dos Professores Guarani Kaiowá, Aty Guasu Jovem, Aty Guasu das Mulheres e acadêmicos indígenas.

Representantes da Presidência da República e integrantes da Comissão Interministerial montada para atuar na questão indígena no estado também acompanharam a marcha até o acampamento. “Importante esse apoio. Claro que precisamos de demarcação e de segurança, mas realizarmos essas atividades tem sido muito importante para nós”, declara Otoniel.

O indígena explica que os Kaiowá não podem mais andar sozinho e ressalta a continuidade das ameaças e ataques, como a da última segunda-feira quando tiros foram disparados contra o acampamento Pyelito Kue, no município de Iguatemi (MS). “As consequências virão, mas o medo nos leva para a vitória. É a assim que acontece conosco”, ressaltou Otoniel.

No último dia 18, o acampamento Guaiviry foi atacado por pistoleiros que atiraram em Nísio Gomes e o levaram em uma caminhonete, junto com outras três crianças da comunidade, desaparecidas até o momento. Deixaram, ainda, vários feridos por balas de borracha no local. As investigações sobre o crime ainda estão em curso. Segundo as testemunhas, Nísio não foi atigindo apenas por balas de borracha, sangrando muito em função de balas no tórax.

“O Nísio foi embora e isso vai continuar acontecendo, temos certeza. Mas temos consciência de que é assim: um vai e os outros ficam para seguir com a luta”, disse Otoniel. Na sexta-feira (2) o Aty Guasu realiza atividade com a Comissão de Direitos Humanos do Congresso Nacional, que visitará acampamentos e tomará depoimentos dos indígenas.

As mortes Kaiowá

Os Guarani-Kaiowá são hoje o mais numeroso povo indígena do país, com mais de 45 mil pessoas que vivem confinadas em 42 mil hectares de terra. A situação de miséria em boa parte das terras do grupo gera um ambiente de violência. Nos últimos oito anos, segundo recente relatório divulgado pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi), houve 250 assassinatos entre indígenas do Mato Grosso do Sul, mais do que todas as mortes ocorridas no resto do país (202). O grupo também sofre com altos índices de suicídio entre os jovens, e desnutrição entre as crianças.

Entre as mortes, há várias lideranças que, como Nísio, lutavam pela demarcação de suas terras. Nos últimos anos, em Paranhos, no Tekoha Ypo'i, foram mortos Jenivaldo Vera, Rolindo Vera (2009) e Teodoro Ricarte (setembro de 2011). Em Coronel Sapucaia, no Tekoha Kurusu Amba, morreram desde 2007 Ortiz Lopes, Xurite Lopes, Osvaldo Lopes e Osmair Martins. Em 2006, em Antonio João, na Terra Indígena Nhanderu Marangatu, foi morto Dorvalino Rocha. Em 2003, em Juti, na T.I. Takuara, Marcos Verón. A lista não para até 1983, quando foi assassinado Marçal de Souza.

Segundo a Constituição de 1988, o processo de demarcação das terras indígenas no país deveria ter sido terminado em 1993. Entretanto, as pressões políticas dos fazendeiros retardaram o processo em MS. No final de 2007, a Funai assinou acordo com o Ministério Público Federal para apressar a demarcação e, em função disso, seis grupos de trabalho para identificação e delimitação de terras indígenas foram lançados em julho de 2008. O fato gerou forte reação dos fazendeiros do estado e, desde 2009, uma série de episódios violentos tem acontecido.

Além de lutar pelas novas demarcações, os Guarani-Kaiowá também aguardam o desfecho de processos antigos, hoje barrados por processos judiciais. É o caso de Terras Indígenas como Takuara, Nhanderu Marangatu, Arroio Korá, Guyraroka, Jatay Vary, Potrero Guasu e outras.


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